Por trás da histórica imagem de um buraco negro divulgada ao mundo nesta quarta-feira (10) estão anos de trabalho de uma jovem cientista americana que liderou a criação de um algoritmo fundamental para esta mais nova conquista da ciência.
Katherine Bouman, ou “Katie” Bouman, como se apresenta, tem 29 anos, é doutora em engenharia elétrica e ciência da computação pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology), uma das universidades mais importantes do mundo, e professora visitante no Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia).
“Há mais de um século, Albert Einstein publicou pela primeira vez sua teoria da relatividade. Desde então, cientistas forneceram muitas evidências para sustentá-la. Mas uma das coias previstas em sua teoria, os buracos negros, ainda não foram observados diretamente”, explicou Bouman em 2016 durante uma palestra no evento TEDxBeaconStreet.
“Apesar de termos algumas ideias de como estes buracos negros possam aparentar, ainda não conseguimos de fato tirar uma foto de um.”
Agora, finalmente em 2019, Bouman foi uma das protagonistas deste feito – e compartilhou em seu Facebook sua reação ao olhar para esta imagem inédita: “Observando incrédula a primeira imagem que eu já fiz de um buraco negro durante o processo de reconstituição (da imagem)”.
Como indica a legenda de Katie, “fotografar” um buraco negro é um longo processo de várias etapas – que inclui desde usar complexas fórmulas matemáticas a lidar com ruídos vindos do espaço.
“Assim como um artista forense usa descrições limitadas para formar uma imagem usando seu conhecimento sobre o formato do rosto, os algoritmos de imagem que eu desenvolvi usam nossos dados limitados de telescópios para compor uma imagem”, explicou a jovem no TEDxBeaconStreet.
Um telescópio do tamanho da Terra
A cientista e a equipe do projeto Event Horizon Telescope (EHT) – responsável pelo feito desta quarta-feira – costumam brincar que captar uma imagem do Sagittarius A, um buraco negro no centro da Via Láctea e que é um dos principais objetos de estudo do time, seria o mesmo que tentar fotografar uma fruta colocada na Lua.
E, como para observar objetos cada vez menores no espaço, é preciso telescópios cada vez maiores, neste caso, a equipe precisaria de um telescópio do tamanho da… Terra.
Por isso, o time do EHT bolou uma alternativa, digamos, mais viável – ainda que bastante complexa.
O projeto reúne oito radiotelescópios ao redor do mundo – do Polo Sul ao Havaí, passando também pelo Chile e Espanha. Com esta rede, os cientistas mimetizam uma espécie de “telescópio virtual” do tamanho da Terra através de uma técnica chamada de interferometria.
É a partir daí que entra o trabalho de Bouman: ela criou soluções matemáticas que preenchem lacunas de dados surgidas, por exemplo, com o atraso inevitável da entrada de ondas de rádio na atmosfera terrestre.
Ela começou a fazer o algoritmo há três anos, quando ainda era estudante de pós-graduação no MIT, liderou o projeto, assistida por uma equipe do Laboratório de Inteligência Artificial e Ciência da Computação do MIT, do Centro Harvard-Smithsonian de Astrofísica e do MIT Haystack Observatory.
Seu trabalho também inovou na forma de combinar estes dados para recompor uma imagem.
“Em linha gerais, temos trabalhado até aqui em como fazer a melhor imagem possível (do buraco negro)”, explicou a jovem à BBC em 2017. “Mas, para começar, foi superdifícil. Não apenas os dados estão superespalhados, mas é incrivelmente barulhento. Temos que lidar com coisas como a atmosfera embaralhando o nosso sinal.”
Da sua abordagem inovadora, Bouman também tornou públicos os modelos criados e dados recolhidos neste processo, para uso de outros pesquisadores.
Horas depois do lançamento da importante da foto, o nome da pesquisadora se tornou uma sensação internacional, com seu nome viralizando no Twitter.
Bouman também foi saudada pelo MIT e pelo Centro Harvard-Smithsonian de Astrofísica nas redes sociais.
Left: MIT computer scientist Katie Bouman w/stacks of hard drives of black hole image data.
Right: MIT computer scientist Margaret Hamilton w/the code she wrote that helped put a man on the moon.
(image credit @floragraham)#EHTblackhole #BlackHoleDay #BlackHole pic.twitter.com/Iv5PIc8IYd
— MIT CSAIL (@MIT_CSAIL) April 10, 2019
No Twitter, o MIT comparou a cientista com Margaret Hamilton, também pesquisadora da instituição que escreveu códigos que ajudaram a colocar o homem na lua. A postagem coloca fotos das duas lado a lado: à esquerda Bouman com pilhas de discos rígidos de dados da imagem do buraco negro e, à direita, Hamilton, com o código que ela escreveu.
“Há 3 anos, a estudante de pós-graduação do MIT, Katie Bouman, liderou a criação de um novo algoritmo para produzir a primeira imagem de um buraco negro”, escreveu o MIT Computer Science & Artificial Intelligence Lab nas redes sociais. “Hoje, essa imagem foi lançada.”
Agora, Bouman espera que sua equipe possa prosseguir com a realização de vídeos dos buracos negros – que, eventualmente, podem revelar outros aspectos físicos, como os campos magnéticos nestes objetos.
Em seu currículo, a cientista diz também trabalhar para que “métodos computacionais expandam as fronteiras para a geração de imagens interdisciplinar”.
Fonte: BBC Brasil