Parece coisa de ficção científica: enquanto voluntários assistiam a trechos de filmes, uma máquina acompanhava suas atividades cerebrais. E a partir destas informaçoes, um computador fazia uma reconstrução parcial das imagens que as pessoas estavam acompanhando.
Cientistas divulgaram os resultados da experiência nesta quinta-feira e especularam que a técnica pode servir em breve para transformar sonhos e alucinações em imagens. No futuro, a tecnologia pode ainda ajudar a vítimas de derrames ou outras pessoas que tenham dificuldade de se comunicar, segundo o neurocientista Jack Gallant, pesquisador da Universidade da Califórnia em Berkley, co-autor do estudo.
Gallant acredita que a técnica servirá um dia para reconstruir um sonho ou outros “filmes mentais”, com qualidade suficiente para que as imagens sejam reconhecidas. O experimento inicial usou cenas capturadas pelos olhos, e ainda é incerto se seria possível utilizar a mesma ferramenta para recriar imagens geradas pelo cérebro.
Não há motivos, portanto, para se preocupar com a possibilidade de termos nossos pensamentos “espionados” secretamente, pelo menos em um futuro próximo, afirma Gallant. No experimento, cada pessoa foi monitorada por uma máquina de ressonância magnética. Outro pesquisador afirmou à Associated Press que acredita que qualquer tecnologia para leitura da mente só será possível em um futuro distante.
Por enquanto, as imagens reconstruídas pelo computador são apenas representações grosseiras do que estamos enxergando, com formas e movimentos sendo capturados com alguma semelhança com as imagens reais. No lugar do ator Steve Martin, por exemplo, o computador é capaz de detectar apenas um borrão.
O novo trabalho foi publicado na internet nesta quinta-feira pela revista científica “Current Biology”. É um passo adiante de uma pesquisa que produziu resultados similares.
O estudo mostra exames feitos no cérebro de três co-autores da pesquisa. Era necessário ficar parado por horas em uma máquina de ressonância magnética conhecida como “funcional”. Em vez de reproduzir a anatomia do cérebro, a ressonância funcional mostra a atividade cerebral.
A primeira tarefa era ensinar o computador como diferentes partes do cérebro de cada uma das “cobaias” respondia a cenas que mostravam objetos em movimento. Os participantes observavam um ponto fixo na tela, enquanto cenas em movimento eram exibidas ao fundo. A etapa durou cerca de duas horas.
Depois de identificar as mudanças na atividade cerebral provocada pelas imagens, a equipe tentou fazer com que o computador tentasse reproduzir os vídeos. A máquina foi alimentada com 18 milhões de vídeos de um segundo do YouTube jamais vistos pelos participantes do estudo. A partir disso, o computador tentou prever qual seria a resposta cerebral que cada clipe produziria. Os pesquisadores fizeram então com que o computador tentasse reconstruir os vídeos utilizando as imagens do YouTube e a atividade cerebral dos participantes.
As reconstruções, portanto, são formadas a partir da mistura de imagens do YouTube. Algumas são mais precisas que outras. Se um rosto humano aparecesse no clipe original, um formato semelhante ao de uma pessoa era gerado na reconstrução. Um clipe que mostrava uma manada de elefantes, no entanto, gerou uma “montanha” amorfa, segundo Gallant.
A qualidade pode ser melhorada com técnicas mais modernas e com um banco de dados mais completo de imagens, segundo o pesquisador.
Ainda assim, os resultados foram considerados “uma das mais impressionantes demonstrações científicas de como o sistema de visão funciona”, afirma Marcel Just, diretor do Centro de Imagens Cerebrais Cognitivas da Universidade Carnegie Mellon.
“Eu daria US$ 50 a US$ 100 para ver meus sonhos reproduzidos com essa qualidade de imagen”, brincou Just, que acredita que a técnica pode ser usada também para prover estímulos cerebrais para pessoas com dificuldades de processar informações visuais.
Michael Tarr, co-diretor de um centro de pesquisas cerebrais ligado à Carnegie Mellon e à Universidade de Pittsburgh, chamou o trabalho de uma “demonstração interessante” de como os cientistas podem usar a ressonância magnética funcional para estudar o cérebro.
“Eu não acho que as pessoas devem interpretar isso como um precursor à leitura da mente”, afirmou Tarr. “O nível de conhecimento que precisaremos ter sobre o cérebro para começarmos a avaliar se será ou não possível ler os pensamentos está a décadas, ou mesmo séculos, de distância.”
Com informações de G1.